domingo, 2 de agosto de 2009

Macrotendências 2

Continua valendo o “disclaimer” do post anterior. Como diria Lulu Santos são idéias que existem na cabeça e não têm a menor obrigação de acontecer.

Demografia e Família:

Uma das tendências que mais têm se fortalecido nos últimos anos é a queda na taxa global de fecundidade. Hoje um terço dos países do mundo já apresentam taxas abaixo de dois filhos por mulher (o mínimo necessário para garantir a reposição da população no longo prazo). Alguns fatores por trás da diminuição na taxa de fecundidade são o aumento no nível de instrução, a popularização dos métodos anticontraceptivos e a crescente urbanização da população. A taxa média global de fecundidade, hoje em 2,6 filhos por mulher, deve continuar caindo até ficar abaixo da taxa de reposição, como efeito disto, eventualmente a população mundial parará de crescer. A previsão da ONU é que a população mundial atinja um nível máximo de 9,5 bilhões de habitantes, por volta de 2070, e a partir daí, comece a diminuir. No Brasil a população pode começar a diminuir em apenas 30 anos.

Os efeitos deste fenômeno são muitos: Por um lado seremos mais ricos, as taxas de crescimento do PIB dos países superarão consideravelmente as taxas de crescimento populacional, ocasionando um aumento considerável na renda per capita a nível global. O banco de investimentos Goldman Sachs prevê que o PIB per capita do Brasil em dólares de 2007 (ou seja, já descontando a inflação), passará dos atuais US$ 8 mil para aproximadamente US$ 48 mil em 2050 (acima do atual PIB per capita norte americano). Em outras palavras, seremos um país desenvolvido. Por outro lado seremos mais velhos, os maiores de 60 anos que hoje representam 11% da população mundial passarão a representar 22% em 2050. No Brasil a tendência é ainda mais forte, aqui a participação dos maiores de 60 na população passará de 10% a 30% no mesmo período.

O núcleo familiar clássico de classe média em uma cidade como São Paulo atualmente já é formado por um casal e um filho único. As pessoas simplesmente não têm mais tempo para criar mais filhos, e nem dinheiro. Dinheiro até teríamos para criar quatro filhos do jeito que os filhos eram criados na década de 1960, o problema é que os filhos de hoje em dia estão cada vez mais caros, demandando investimentos pesados em educação, vestuário, lazer e na satisfação de crescentes necessidades de consumo. Escolhemos ter apenas um filho para poder “dar o melhor” pra ele, preferimos colocar nosso filho único na melhor escola do que ter que matricular dois ou três rebentos em uma escola mais barata e, teoricamente, pior.

Já falei aqui neste blog da idéia do filho coletivo, e admito que ainda existem barreiras sociais fortes que impedem a proliferação deste modelo no curto prazo. Mas se temos cada vez menos tempo para os nossos filhos e se custa cada vez mais caro mantê-los e prepará-los para o mundo competitivo que os aguarda, nada mais natural que maximizemos estes dois recursos escassos (tempo e dinheiro) nos associando em grupos ampliados de pessoas em torno de um só filho. Se em 1950 um casal tinha seis filhos, passou a ter dois em 1980 e hoje tem apenas um, é natural esperarmos que o casal do futuro tenha 50% ou 20% de um filho, compartilhando-o com outros.

O núcleo familiar tende a ficar mais flexível. Hoje vemos cada vez mais pessoas morando sozinhas, ou em núcleos familiares reduzidos. A idéia de que um casal deve morar junto já vem sendo questionada, e casais começam a morar separado por opção. Os relacionamentos duram menos tempo e a idéia de juntos para sempre vai se tornando uma utopia. O percentual de homossexuais (que na prática não podem ter filhos biológicos) vem aumentando, assim como o de bissexuais (que por definição não se satisfazem, no longo prazo, com um só parceiro). Junte-se a isso a idéia de que o filho não será de um casal, mas de um grupo, e temos um conceito expandido de família. No final disso tudo as pessoas morarão sós ou em grupos, mas estes grupos terão menos a ver com relações consangüíneas e hereditárias, e mais com relações afetivas e não exclusivas. O lar do futuro pode ser composto de três adultos, um idoso e uma criança, que podem não ter laços de sangue ou relacionamento conjugal, mas que se gostam, se ajudam e vivem em uma certa harmonia formando, portanto, uma família, por que não?

Outra ruptura no conceito tradicional de família deve vir junto com a evolução da engenharia genética. Não imagino que na segunda metade deste século as mulheres ainda carreguem um feto em seu corpo por 9 meses. A opção de uma gravidez completa “in vitro” sofrerá, a princípio, uma forte oposição cultural, principalmente por grupos religiosos, mas eventualmente passará de exceção à regra. Sejamos práticos, pra que passar nove meses carregando um bebê na barriga quando se pode manter o corpo inalterado e ir visitar o feto no laboratório mais próximo sempre que quiser? No laboratório o feto terá perto de 100% de chances de sobrevivência, não estando exposto a acidentes ou doenças. Dependendo da evolução da engenharia genética talvez esperar nove meses não seja mais necessário. Num mundo onde as pessoas se preparam cada vez mais antes de ter um filho, este período obrigatório de preparação biológica deixa de fazer sentido.

Em algum momento surgirá a dúvida: prefiro um filho que se pareça comigo ou com o Brad Pitt? Com um mundo de possibilidades para alterar (e melhorar) geneticamente o DNA do rebento que vem por aí será cada vez mais tentador escolher um filho mais bonito e inteligente que o filho do vizinho, ao invés de um que herde seu pé chato ou seu cabelo ruim. Mais importante do que isso é a questão ética que começa a ficar confusa quando levamos em conta questões de saúde: será que eu quero ter um filho da forma “natural” que herdará minha predisposição genética a diabetes ou a doenças do coração ou prefiro escolher um gene “melhorado”, com chances consideravelmente menores de desenvolver uma destas doenças? Não será uma escolha fácil.

Enfim, mesmo que as pessoas das próximas gerações sejam mais bonitas, mais inteligentes e mais bem preparadas (lembrem-se do conceito do filho coletivo), voltamos ao problema discutido no primeiro parágrafo, elas virão em menor número. O envelhecimento constante da população traz problemas graves. Por mais que uma melhor qualidade de vida proporcione às pessoas uma vida produtiva mais longa, a humanidade sempre precisará de renovação, como iremos reverter a tendência de queda na taxa de fecundidade? Como iremos convencer as pessoas a ter mais filhos? Será que um dia os governos dos países precisarão criar uma safra de crianças (a lá Admirável Mundo Novo) para compensar o declínio natural dos nascimentos? Fica para reflexão...

Um comentário:

  1. “Pois é, sinto que nessa análise de futuro de uma certa forma voltaremos à idade das cavernas, com famílias morando juntas e compartilhando o crescimento dos filhos. Enquanto saíam pra caçar os "filhotes" por serem mais fracos estariam sujeitos a ataques de animais selvagens... será que nesse futuro também não seria eficaz a permanência da mulher no lar, controlando a pornografia online, não deixando os meninos saírem na porrada e coisas do gênero? Fica a dúvida... E quem sabe também, com mais homens e mulheres vivendo juntos não se criaria uma situação de poligamia, como quando reinava, soberana, a porretada na cabeça... E algumas mulheres dividindo os mesmos homens, quem sabe a porretada não passasse a ser ao contrário, a mulher no homem? Gosto dessa idéia de futuro selvagem...

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